sábado, setembro 17, 2005

Conto contido

Bem, acho que posto aqui meu primeiro conto, de verdade, o qual eu pelo menos revisei. Espero que alguém leia, pois é conto porque quero contar algo. Sim, me copiei várias vezes!

Quando passa da conta já é hora de parar.


Muitas luzes, muitas vidas, muitas coisas, coisas. O céu lá fora arde, o corpo está melando, este inferno que se faz agora, aqui, parece ter sido encomendado, parece ser ambientação da festa.

Eu não quero evitar a rua, o movimento, as pessoas, mas se bem que adoraria ser evitado, ser invisível, ignorado por uma noite. Por uma noite talvez seja pouco, por uma vida talvez seja muito, talvez eu só não queira ter que me relacionar por agora.

Ainda bem que as mentiras são feitas em primeira pessoa, pelo menos um pouco de verdade. Tenho que escolher uma roupa, sair pelado não vai me fazer ser invisível, não em 2005.

Que tipo de pessoa quero ser hoje? Rocker? Eletrônico? Playboy? Acho que hoje me sinto meio comercial de Coca-Cola: vou de jeans, camiseta colorida e um sorriso eterno estampado na cara. Alegria! Alegria! Ironia! Agonia!

Nos ouvidos: Moby! Mais comercial impossível, estou pronto para ser uma estrela da noite. Até que caminhar sozinho à noite não é ruim. O vento que sopra, os carros que passam, a liberdade, a liberdade! Sempre que vou assim andando vou pensando, doido para chegar, para não ter que mais pensar. Balançar a bunda, balançar o corpo, sacudir a vida!

Hoje a festa é das legais, bizarras! É destas, em que as pessoas estão mais alteradas, que sempre espero a reviravolta, a virada de mesa, a minha vez de ganhar na loteria! Hoje à noite vou achar o portal da felicidade, se bem que eu desconfio que ele fique no banheiro feminino, atrás da porta da última privada. Bem que sempre vejo uns homens entrando ali. Alguns nem são assim tão homens. Também, quem é?!

Oi!
E aí, vai entrar?
Vou sim. Tá sumido...
Pois é, muito trabalho. Vamos entrar então?
Vamos sim.

O que?! Não estou te ouvindo direito...
Falei que você está muito legal hoje.
Ah, valeu! Você também, como sempre, não é?!

É sempre muito mais gente do que preciso par ser feliz, no começo da noite. No fim o sentimento é de que faltou alguém. De que falta alguém no mundo, que me mandaram pra cá e meu par perfeito não foi liberado na alfândega divina. Mas enfim, todos têm que ser cumprimentados, é assim que se mantém no jogo. Assim se mantêm as estrelas. Todos são estrelas, maiores que o espaço.

Tudo é muito curto.

Inclusive o tempo que tive para reparar que os braços de outrem já recebiam o corpo que eu desejava. O corpo que há poucos minutos havia me olhado de forma tensa, havia me seduzido com sorrisos e esbarrões. Era um corpo, um corpo do qual eu me lembrava muito bem, há muito tempo desejado.

Tem gente que é assim, prefiro acreditar que não é sozinha esta atitude. Não é possível que apenas o meu objeto de desejo, meu porto seguro, minha felicidade e companhia para as boas horas é que é assim, assim tão falso. Tão fugaz. Que as pessoas passem rapidamente eu já não acho ruim, mas que passem de verdade, pela minha boca, pelos meus braços, pela minha cama.

Eu havia prometido, para mim, que não diria nada, não externamente, não diretamente. Sensações estranhas dominam a gente como nenhuma paixão pode dominar. A coceira que vem subindo pé acima, dominando a pele, as entranhas, a razão, sua dimensão, seu reinado! Completamente dominado, refém, esculhambado e maltratado. As vontades, principalmente de ser agressivo, são assim também: indomináveis, inomináveis, infecundas.

Filédaputa! É isso mesmo! Você não merece nem uma frase, nem uma vírgula, nem uma gota de mim que seja! Morra só!

Às vezes as palavras não dão conta dos sentimentos, na verdade, nunca dão, a gente é que tenta moldá-los à imagem das palavras que sabemos. Sentir é um plano que existe somente dentro de nós, a tentativa de exteriorizar às vezes é cruel, mentirosa e impotente, e assim nos sentimos. Palavras às vezes são pouca coisa, às vezes são muita coisa. Por isto muito cuidado tenho ao dizer eu te amo. Pelo menos enquanto ainda estou sóbrio.

Não vou me abalar. Em cada festa a gente finge que a soma foi positiva, e, às vezes, a gente não tem nada a viver e vive. E, às vezes, a gente não tem nada a dizer e diz.

O que é que foi que você fez lá dentro?! Surtou? Fala comigo porra!! A gente se conhece há muito tempo, sei mais de você do que você mesmo sabe.
Não te interessa! Fiz o que eu fiz, deixei de fazer muita coisa e isto me dói muito mais.
Não chora vai... mas você não devia ter feito isto. Nem foi nada assim tão grave. Não é você quem sempre diz que cada um tem que ficar com que quiser?
Disse, não repito. Não agora. E quer saber? Vá se divertir, eu vou-me embora e nem adianta tentar querer conversar.

Cansei! Cansei de ouvir discursos, cansei de ter que reconstruir o meu discurso. Cansei de discutir a minha vida, de ter que ouvir as construções mais absurdas das vidas alheias. O nó que se ata na garganta aumenta na presença dos outros, não sinto vontade de me desfazer, de me refazer, de me analisar, de me repensar, de me autocriticar. Quero sim ser burro, cego, enxergar a minha verdade. Quero ser verborrágico, ser lascivo, penetrante, ser auto-suficiente. Quero gozar comigo mesmo, quero me bastar. Pessoas são sempre impertinentes, não sabem ouvir, apreciar, admirar, ficarem caladas às vezes, só um pouco.

E se os discursos forem inconseqüentes? Se quiserem ser banais? Se forem apenas duvidosos? O que você tem a ver com isto? O que eu tenho a ver com isto? Não ouse falar do que não sabe, do que não sabe se eu penso.

O fim, a volta, é longa a caminhada. A solidão, não mais a liberdade. A crônica anunciada de uma noite má. Todas as noites são más. Todas elas adoram me enganar, me dar esperanças, dançar, dançar e dançar.

O vento frio dói na alma, não sei se ele ou a memória do que foi. A água molha o corpo, não sei se ela ou se as lágrimas que vertem pelo nariz e boca. A chuva embaça a vista, ou será que a visão está mesmo turva? Nunca bebo demais, só em ocasiões especiais, festas estreladas!