domingo, junho 19, 2005

D

Ele acordou, não havia outro jeito, não de ficar em pé. Acordou mais cedo do que gostaria. A casa muito barulhenta. As pessoas cada vez mais em suas metamorfoses. Um café, algo para enganar o estômago antes de enganar o tempo. Internet. O almoço é uma obrigação social e familiar, ele nunca gostou de almoçar discutindo ou vendo TV. Não é possível comer de verdade com a família. É como fazer sexo, a família não irá compreender como se come. Melhor não dizer. E ele não gosta mais daquela comida, são 23 anos do mesmo tempero. Imaginando como seria morar sozinho, poder almoçar no horário que quisesse, poder almoçar o que ele quisesse, poder comer quem ele quisesse. Liberdade! - Ei menino! Vamos ajudar a arrumar a rebinboca da parafuseta. Que saco! É perda de tempo, ninguém entende sua impaciência. Ninguém consegue pensar de verdade. Uma tarde perdida, uma vida esquecida. O telefone não toca. Nunca. Os amigos... indefinível neste momento. Mas ele pode ligar primeiro. É aniversário de uma amiga, que ele adora! Ótimo! Os parabéns são sutilmente menosprezados, a alegria não parece recíproca. Ele não faz parte da felicidade destes amigos, não é bem-vindo. Tudo pode mudar. Talvez, ele pensa, quem se apresentar primeiro, ou melhor, os seis primeiros ganham carteirinha e privilégios de amigos-do-peito. Tudo bem, a falta de grana força a um programa familiar para a noite ( a falta de convites outros também). Uma peça de teatro... parece bom. Ingressos esgotados! Um conhecido lhe diz - sem distinguir se com desdém ou como informação apenas. Ok, ficaremos, a família coração, na fila, unida. Pessoas sempre indesejáveis têm convite. Porque eu não!? Injusto! Boa notícia. A moça disse que poderemos entrar. Entramos. Com atraso. Cada um que cate seu lugar. Os que sobraram. E a tosse? Não o irá atrapalhar, ele tem um spray para garganta. Ninguém será incomodado, nem ele se sentirá envergonhado. A peça é bela, a atriz é bela, a tosse brava. 5 minutos tossindo até as lágrimas escorrerem, ainda bem que a educação o fez sair do teatro no início do surto. A peça está terminando, mas a tosse torrencial, como a chuva que agora cai. O molhado na cabeça escorre sem encontrar obstáculos, nele só restou ausência. É melhor encerrar o dia. Antes uma refeição num restaurante português. Mas ele nunca gostou de bacalhau e camarão. Em casa. Sempre há a pessoa que pode salvar, o guardião da beleza da felicidade e da paz. Ele não quer conversar, ou talvez não possa. Há vida fora dele e isto lhe irrita. Nada mais preciso que conversar com Lya Luft. Perdas & Ganhos.

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